Enfatiza-se que o assédio moral é caracterizado por uma conduta abusiva seja do empregador que se utiliza de sua superioridade hierárquica para constranger seus subalternos ou seja dos empregados entre si com a finalidade de excluir alguém indesejado do grupo o que pode se dar aliás muito comumente por motivos de competição ou de discriminação pura e simples. Ao primeiro fenômeno se dá o nome de assédio vertical bossing ou mesmo mobbing descendente como prefere denominar o Heinz Leymann psicólogo e cientista médico alemão que na década de 80 começou a estudar o fenômeno do assédio moral a partir de experiências verificadas por outros estudiosos em grupos de crianças em idade escolar que tinham comportamentos hostis cujas manifestações começaram a ser percebidas vinte anos depois no ambiente de trabalho.

Assim o que se verifica no assédio vertical é a utilização do poder de chefia para fins de verdadeiro abuso de direito do poder diretivo e disciplinar bem como para esquivar-se de consequências trabalhistas. Tal é o exemplo do empregador que para não ter que arcar com as despesas de uma dispensa imotivada de um funcionário tenta convencê-lo a demitir-se ou cria situações constrangedoras como retirar sua autonomia no departamento transferir todas suas atividades a outras pessoas isolá-lo do ambiente para que o empregado sinta-se de algum modo culpado pela situação pedindo sua demissão. Já o fenômeno percebido entre os próprios colegas de trabalho que motivados pela inveja do trabalho muito apreciado do outro colega o qual pode vir a receber uma promoção ou ainda pela mera discriminação motivada por fatores raciais políticos religiosos etc. submetem o sujeito “incômodo“ a situações de humilhação perante comentários ofensivos boatos sobre sua vida pessoal acusações que podem denegrir sua imagem perante a empresa sabotando seus planos de trabalho é o denominado assédio horizontal.

Ainda são enumerados como espécie de assédio moral o mobbing combinado e o mobbing ascendente conforme classificação de Leymann. Aquele se daria com a união tanto do chefe quanto dos colegas no objetivo de excluir um funcionário enquanto o último seria o assédio praticado por um subalterno que se julga merecedor do cargo do chefe bem como por um grupo de funcionários que quer sabotar o novo chefe pois não o julgam tão tolerante quanto o antigo ou tão capacitado para tal cargo.

Na formulação atual o assédio moral é concebido como uma forma de ‘Terror psicológico“ praticado pela empresa ou pelos colegas que também é definido como “qualquer conduta imprópria que se manifeste especialmente através de comportamentos palavras atos gestos escritos capazes de causar ofensa à personalidade à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa de colocar seu emprego em perigo ou de degradar o clima de trabalho“ ou mesmo como “prática persistente de danos ofensas intimidações ou insultos abusos de poder ou sanções disciplinares injustas que induz naquele a quem se destina sentimentos de raiva ameaça humilhação vulnerabilidade que minam a confiança em si mesmo“. De tais conceitos podemos depreender que o elemento comum além da finalidade de exclusão é a modalidade da conduta a qual sempre se verifica agressiva e vexatória capaz de constranger a vítima trazendo nela sentimentos de humilhação inferiorização afetando essencialmente a sua auto-estima.

A principal implicação do terrorismo psicológico é a afetação da saúde mental e física da vítima mais comumente acometida de doenças como depressão e stress chegando por vezes ao suicídio. Um dos elementos essenciais para a caracterização do assédio moral no ambiente de trabalho é a reiteração da conduta ofensiva ou humilhante uma vez que sendo este fenômeno de natureza psicológica não há de ser um ato esporádico capaz de trazer lesões psíquicas à vítima.

Como bem esclarece o acórdão proferido no Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região “a humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do assediado de modo direto comprometendo sua identidade dignidade e relações afetivas e sociais ocasionando graves danos à saúde física e mental que podem evoluir para a incapacidade laborativa desemprego ou mesmo a morte constituindo um risco invisível porém concreto nas relações e condições de trabalho“. Assim o arco temporal deve ser suficientemente longo para que cause um impacto real e de verdadeira perseguição pelo assediador.

Atualmente não se fala em um tempo determinado em dias ou meses porém foi constatado que o assédio moral em regra se configura no prazo de 1 a 3 anos o que porém não deve servir de parâmetro vez que o assédio pode ser verificado em tempo mais exíguo dependendo do tempo que o dano levar para se instalar. O assédio moral é uma das formas de se configurar o dano aos direitos personalíssimos do indivíduo. Assim um ato violador de qualquer desses direitos poderá configurar dependendo das circunstâncias o assédio moral o assédio sexual ou a lesão ao direito de personalidade propriamente dita. A diferença entre eles é o modo como se verifica a lesão bem como a gravidade do dano.

Dessa forma teríamos o assédio moral como uma situação de violação mais grave que a “mera“ lesão do direito de personalidade eis que acarreta um dano à saúde psicológica da pessoa à sua higidez mental o que deve ser mais severamente repreendido pelo ordenamento. Tal repreensão se revela principalmente no tocante à valoração da indenização advinda do assédio moral que deve ser analisada de modo diverso daqueles critérios comumente utilizados para as demais formas de pleito do dano moral. Nota-se que não é dado ao assediado a devida atenção valorativa na reparação do dano sofrido pois como forma mais grave de violação da personalidade e da saúde mental do trabalhador mereceria indenização superior.

Estudos feitos por médicos e psicólogos do trabalho mostram que o processo que desencadeia o assédio moral pode levar à total alienação do indivíduo do mundo social que o cerca julgando-se inútil e sem forças e levando muitas vezes ao suicídio. Levando isso em conta a não configuração do assédio moral pela ausência do dano psíquico não exime o agressor da devida punição pois a conduta será considerada como lesão à personalidade do indivíduo ensejando o dever de indenizar o dano moral daí advindo.

Destarte a pessoa que resiste à doença psicológica seja por ter boa estrutura emocional seja por ter tido o cuidado de procurar ajuda profissional de psicólogos ou psiquiatras não será prejudicada pois sempre restará a reparação pelo dano moral sofrido ainda que o mesmo não resulte do assédio moral. Assim reiteramos nosso entendimento no sentido de que nem todo dano à personalidade configura o assédio moral como se percebe na maioria dos estudos jurídicos atuais e principalmente nas decisões da Justiça do Trabalho. O que se observa é a banalização do instituto que é quase confundido com o dano moral ou seja basta o empregador insultar o empregado uma vez diante dos colegas para que o Poder Judiciário condene a empresa por assédio moral.

O que se pretende é justamente delinear os limites em que o assédio moral se dá para que não haja generalização do instituto fugindo da natureza que o criou que é a preocupação com as doenças psicológicas nascidas nas relações de trabalho. Nessa esteira entendo que a configuração do assédio moral depende de prévia constatação da existência do dano no caso a doença psíquico-emocional. Para tanto necessária a perícia feita por psiquiatra ou outro especialista da área para que por meio de um laudo técnico informe o magistrado que não poderia chegar a tal conclusão sem uma opinião profissional sobre a existência desse dano inclusive fazendo a aferição do nexo causal.

Ressalto que a prova técnica para a constatação do dano deve ser produzida por perito da área médica sem o que não há como se falar em assédio moral eis ausente seu pressuposto essencial: o dano psicológico ou psíquico-emocional. Para concluir esse ponto reitero que: a) a existência do dano psíquico emocional ou psicológico é requisito para configuração do assédio moral; b) é necessária a prova técnica do dano que se daria por meio de laudo médico afirmando existir a doença advinda do trabalho; c) a vítima da conduta assediadora que não sofrer esse tipo específico de dano não ficará desprotegida pois ainda poderá pleitear danos morais pela ofensa aos seus direitos de personalidade.

Por Sônia Mascaro Nascimento – Revista Consultor Jurídico.

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