NOMEADA em julho do ano passado a secretária da Receita Federal Lina Maria Vieira 59 diz que mudou as regras da fiscalização porque a ação do fisco era “engessada e superficial“. Muito concentrada nas investigações de pequenos contribuintes Lina promete que os fiscais agora vão atrás dos grandes sonegadores. E promete melhorar o atendimento aos contribuintes que precisam enfrentar o fisco pessoalmente. Criticada dentro da própria Receita por ter mudado toda a cúpula do órgão Lina culpa os “descontentes“ diz que tem o apoio da maior parte dos servidores para as mudanças e que boatos sobre sua demissão são “besteira“.

Para concentrar esforços sobre os grandes contribuintes a secretária da Receita Lina Maria Vieira diz que vai sair do pé dos assalariados que fazem deduções de despesas médicas. Para isso a Receita mudará o método de seleção dos contribuintes que serão fiscalizados. A seguir os principais trechos da entrevista concedida à Folha na sexta-feira.

FOLHA – Qual será o efeito da crise sobre a arrecadação?
LINA MARIA VIEIRA – Nem Deus sabe. Vivemos um momento econômico totalmente diferente dos anos anteriores e estamos fazendo uma revisão da receita que ainda não está concluída. Leio nos jornais que a arrecadação está caindo e começam as discussões de substituição [no comando da Receita]. é como no futebol -se o time não vai bem muda-se o técnico. Só que não se pode comparar alho com cebola. A realidade econômica não comporta comparações com 2008. Em janeiro e fevereiro do ano passado houve eventos especiais que interferiram na arrecadação. As desonerações também devem ser levadas em consideração. São R$ 138 bilhões previstos em 2009 e mais R$ 18 bilhões na Previdência Social.

FOLHA – Mas as multas aplicadas pela Receita em 2008 foram R$ 30 bilhões inferiores às de 2007. Isso não é sinal de perda de eficiência?
LINA – De forma nenhuma. A queda de R$ 30 bilhões nos autos de infração em relação a 2007 representam o período da greve dos auditores. Em janeiro e fevereiro de 2008 foram lançados R$ 55 bilhões. E neste ano já são R$ 95 bilhões. O diagnóstico que me apresentaram era de uma fiscalização “engessada e superficial em que se fazia a promoção das atividades por quantidade de operações e não pelo resultado“. A meta era realizar mil fiscalizações no ano. Não interessava que tipo de contribuinte que valor seria resgatado para o Tesouro. Para atingir a meta fazia-se um número muito grande de [fiscalizações de] pessoas físicas de despesas médicas. Vamos fiscalizar com base em indicadores de risco priorizar os grandes contribuintes.

FOLHA – A Receita vai sair do pé de assalariados que fazem deduções de despesas médicas?
LINA – Vai. Nosso foco serão grandes empresas e diligências para a recuperação dos créditos [multas que são alvo de recursos administrativos e judiciais].

FOLHA – Mas não foi sempre assim?
LINA – Pedi um diagnóstico da fiscalização. Veio um de que atuamos num sistema onde a avaliação era feita pela quantidade de operações onde havia menor complexidade [nas investigações escolhidas].

FOLHA – Por que a fiscalização era assim?
LINA – Era um contexto econômico diferente em que se batia recorde de arrecadação todos os meses. Então a fiscalização não precisava ser tão puxada em termos de critérios.

FOLHA – Como funcionará agora?
LINA – Mudamos o método de seleção dos contribuintes que serão fiscalizados. Isso está sendo feito com base na análise de risco de sonegação. Também temos de acompanhar a cobrança do crédito tributário. Grandes créditos ficavam aguardando muito tempo para julgamento. Criamos uma coordenação para fazer estudos e acompanhamentos setoriais. Isso não existia. Os resultados devem ser mais consistentes.

FOLHA – Num cenário de queda de arrecadação aumento de desonerações e a intenção de não cortar investimentos como é que o governo vai fechar suas contas? Vai reduzir o superávit primário?
LINA – Você corta o que é supérfluo. A discussão em relação ao primário é feita com o Tesouro não vou me pronunciar.

FOLHA – Há espaço para elevar a carga tributária?
LINA – Não. Agora é só desoneração. Vamos trabalhar a eficiência da administração tributária [para obter ganhos de arrecadação].

FOLHA – E para novas desonerações tributárias?
LINA – Da parte da arrecadação não há a não ser que o governo entenda que pode sobreviver com uma receita bem menor.

FOLHA – A senhora defende que as desonerações tenham contrapartidas como garantia de emprego?
LINA – Acho importante. Desonerou-se muito a construção civil e o que aconteceu com o preço do cimento? Subiu. Os setores produtivos também têm de dar retorno.

FOLHA – O governo criou duas novas alíquotas no Imposto de Renda para as pessoas físicas. é preciso mudar mais alguma coisa?
LINA – Por enquanto precisamos ver os resultados dessa primeira medida. Ao criar a alíquota de 75% beneficiamos 4 milhões de pessoas.

FOLHA – As deduções com educação podem ser ampliadas?
LINA – é uma discussão interessante -por que é permitido abater despesas médicas sem limites e não as de educação? Mas a ampliação ou não depende de uma discussão mais ampla -sobre as entidades educacionais que hoje não pagam Imposto de Renda por exemplo.

FOLHA – Como será a restituição do IR cobrado sobre férias vendidas?
LINA – Vamos construir um sistema informatizado. Queremos fazer de forma simples. Mas ainda não há prazo. Vamos intensificar o atendimento eletrônico aos contribuintes.

FOLHA – Como isso será feito?
LINA – A partir de março será possível fazer um cadastro no site da Receita e receber uma senha. Isso permitirá por exemplo que o contribuinte tire o extrato do IR que saiba o motivo de estar na malha fina. A emissão do CPF também será simplificada. As entidades conveniadas com a Receita farão a emissão imediata do documento a partir de agosto. Estamos discutindo também o preço. Se a pessoa não fizer questão do cartão de plástico poderá tirar o documento gratuitamente.

FOLHA – A senhora foi nomeada em agosto de 2008 após a demissão de Jorge Rachid ligado ao ex-secretário Everardo Maciel e ao ex-ministro Antônio Palocci. A troca foi interpretada como uma politização da Receita. A senhora é petista?
LINA – Não. Não tenho partido político. Minha atividade sempre foi técnica. Fui secretária de Fazenda do PMDB quando foi governador [do Rio Grande do Norte] o senador Garibaldi Alves Filho. Fui secretária no governo do PSB da governadora Wilma de Faria que são oposição no Estado. Fiquei secretária num governo fiquei em outro e hoje estou aqui.

FOLHA – A senhora mudou todos os secretários-adjuntos e representantes do fisco nos Estados. Houve críticas de aparelhamento com a indicação de sindicalistas…
LINA – Foi uma oxigenação da casa que há 13 anos estava nas mãos dos mesmos. Se houve manifestação contrária certamente foi dos descontentes. Na Receita 99% dos servidores são sindicalizados. Continuam requentando matéria velha. A maior parte dos integrantes desta casa está muito satisfeita com as modificações.

FOLHA – Quais os critérios usados?
LINA – Analisamos currículos coisa que nunca foi feita. Qualquer funcionário pode participar de cursos no Brasil ou no exterior. Nunca se ouviu que alguém tinha sido escolhido apresentando um currículo um projeto de trabalho. Abrimos um processo seletivo interno para escolher delegados e inspetores. Vamos fazer o rodízio a cada dois anos.

FOLHA – Qual a explicação para essas críticas?
LINA – A estrutura é muito antiga.

FOLHA – Até a sua chegada as discussões de projetos de lei sobre matérias tributárias por exemplo eram feitas pelo secretário da Receita. Hoje são atribuição do secretário-executivo Nelson Machado. A Receita perdeu poder?
LINA – Não. A Receita não é um órgão independente do ministério [da Fazenda] como se fazia ser. Era uma Receita blindada onde as informações não saíam. Precisam conhecer as atribuições da secretaria-executiva para não dizerem tanto disparate.

FOLHA – A senhora está sendo demitida?
LINA – Nem eu estou saindo nem essa é a posição do ministro [Guido Mantega] que já disse que essa é uma grande besteira. São os descontentes plantando notícias que não têm nenhum fundo de verdade. A nomeação para cargos de confiança pressupõe demissão ad nutum [a qualquer momento por vontade do superior]. Só quem pode dizer quando isso acontecerá é o ministro.
Fonte: Folha de S.Paulo

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